“Este livro – um desolado carrossel fantasmagórico de vidas penduradas por um fio, em busca de um lugar para chamar de ‘lar’ – faz do limiar entre o que é o ‘paraíso’ e o ‘inferno’ (e as representações cristalizadas que deles se construíram ao longo dos séculos) um ponto de partida para uma nova realidade”. As palavras de Prisca Agustoni na apresentação evidenciam, ao mesmo tempo, a estrutura de Um paraíso portátil e o seu centro: ao longo das cinco partes nas quais se distribuem, os poemas de Roger Robinson compõem um arranjo de vozes e formas diversas para expor as violências colonial e étnico-racial em suas mais variadas manifestações. Britânico de origem caribenha, o autor se vale da dub poetry; da citação de “vozes amigas” como Coltrane, Fela Kuti e Bob Marley; de trechos mais confessionais e prosaicos; de certa inspiração cinematográfica; de humor e de causticidade. Mas há algo além de que Robinson não se esquece nessa busca pela elaboração de lutos e traumas: um conselho de sua avó, em que o autor se agarra para seguir acenando rumo a alguma cura possível, um remédio coletivo ou particular.
Publicado originalmente no Reino Unido em 2019 (Peepal Tree Press), A portable paradise venceu o T.S. Eliot Prize do mesmo ano. A obra chega ao Brasil numa coedição entre as editoras Incompleta e Jabuticaba.
R$ 58,00
Título: Um paraíso portátil
Autor: Roger Robinson
Tradutor: Victor Pedrosa Paixão
Texto de apresentação: Prisca Agustoni
Texto da orelha: André Capilé
Ano: 2024
Gênero: Poesia
Encadernação: Brochura
Formato: 21,5 x 16 x 0,5 cm
Peso: 180g
Tiragem: 650 exemplares
ISBN: 978-65-88104-25-5
Coordenação editorial: Cesare Rodrigues, Laura Del Rey e Marcelo Lotufo
Preparação de texto: Cesare Rodrigues, Laura Del Rey e Marcelo Lotufo
Capa: Laura Del Rey [adaptando a capa original de Nicola Griffiths]
Projeto gráfico e diagramação: Laura Del Rey, Angela Mendes e Fernando Zanardo
Fotografias: Johny Pitts [capa] e Clifford Prince King [p.1]
Assistência editorial: Fernanda Heitzman
Uma coedição Editora Incompleta + Edições Jabuticaba
ROGER ROBINSON é um poeta, músico e performer britânico. Tendo passado parte da infância e a adolescência em Trindade e Tobago, hoje vive em Londres e já se apresentou pelo mundo todo, inclusive em turnês realizadas com o apoio do British Council a países como Argentina, Filipinas e Vietnã. É cofundador do Spoke Lab e do coletivo global de escrita Malika’s Kitchen.
Vencedor do T.S. Eliot Prize 2019 e do RSL Ondaatje Prize 2020 (organização da qual hoje é membro) por seu livro “A portable paradise” (Peepal Tree Press, 2019), Robinson foi selecionado por deciBel & Arts Council England como um dos 50 escritores que mais influenciaram o cânone literário negro-britânico.
Seus textos e poemas integram uma série de antologias, como: The forward book of poetry 2024 (Faber and Faber, 2023); Mapping the future: the complete works (Bloodaxe Books, 2023); Poetry unbound: 50 poems to open your world (W. W. Norton & Company, 2022); The fire people: a collection of British black and Asian poetry (Canongate Books, 2022); Out of bounds: British black and Asian poets – Newcastle/Bloodaxe (Bloodaxe Books, 2014); e Ic3: the Penguin book of new black writing in Britain (Penguin UK, 2000). Além disso, o artista recebeu encomendas de várias instituições, como: London Opera House, Tate, The National Portrait Gallery e Theatre Royal Stratford East, onde também foi um artista associado.
Antes do sucesso de A portable paradise, seu livro The butterfly hotel (Peepal Tree Press, 2013) havia ficado entre os finalistas dos prêmios OCM Bocas e Oxford Brookes, além de ter sido fortemente elogiado pelo Forward Poetry. Por essa série de reconhecimentos, Robinson já foi convidado a compor o júri de algumas das mais prestigiadas premiações literárias do mundo.
Ex-aluno do programa nacional de mentoria The Complete Works (fundado por Bernardine Evaristo), RR hoje ministra oficinas, algumas das quais integram o website Can I have a word?, da desenvolvedora Barbican, que venceu o prêmio Webby de 2006. Seu poema ‘A portable paradise’ compõe a ementa do programa de estudos GCSE (General Certificate of Secondary Education) de Literatura Inglesa do Reino Unido.
Livro vencedor do T.S. Eliot Prize 2019 e do RSL Ondaatje Prize 2020.
“Seus poemas são profundos, maduros, comoventes e inventivos.” –– Bernardine Evaristo [The New Statesman]
“Os poemas de Roger vão desde a tragédia da Grenfell Tower até o nascimento prematuro de seu filho. Através de seu eu interior como indivíduo britânico e negro de origem caribenha, nos conectamos à sua humanidade e acessamos suas vulnerabilidades, sua visão, suas experiências, sensibilidades e seus pontos de vista.” –– Bernardine Evaristo [Vogue]
“Uma crítica mordaz e uma meditação sobre o amor. Robinson olha intrepidamente para o legado da escravidão e, ainda assim, em seu coração, acredita em bondade e comunidade.” –– John Field [ júri – T. S. Eliot Prize]
“Há urgência política na escrita de Robinson: traz visibilidade às pessoas marginalizadas e estoura num viva-voz as histórias de enfermeiras jamaicanas, jovens muçulmanos e homens negros da Inglaterra. Ele se aproxima com foco a laser da vida de pessoas comuns – “meninos encapuzados”, avós que “cortam carne de bode e a temperam” e “Bob Marley em Brixton”, comprando um suco de amendoim sem o contexto revolucionário de sua música rebelde.” –– Amilcar Sanatan [Newsday Trinidad and Tobago]
“Dá palavras ao não-dito e indescritível de uma maneira que realmente nos atinge a alma.” –– Eddie Saint-Jean [What’s Hot London?]
“Embora escrito antes, esse livro se tornou uma companhia oportuna, profética, pungente e perfeita para o ano da pandemia e do movimento Black Lives Matter. Racismo, identidade, Grenfell Tower, Windrush são temas constantes. Mas para além de um objeto político, Um paraíso portátil é uma obra sobre a beleza. Histórias brutais de sofrimento são contadas de forma crua em meio à beleza da vida, do viver e das famílias.” –– Jim Monaghan [Bella Caledonia]
CULPA
O prédio queimou,
então o concelho culpou os empreiteiros,
que trituraram todos os papéis;
então os empreiteiros culparam
a secretaria de saúde e segurança pela
aprovação de todos os testes requeridos;
então a primeira-ministra
veio, viu e partiu,
e não falou com ninguém,
e não cumprimentou ninguém.
Enquanto isso, largam os inquilinos
para enlutarem-se em hotéis estéreis,
com nada a enterrar além de cinzas;
e como zumbis, os sobreviventes andam
tentando não olhar para cima,
para a lápide carbonizada.
As pessoas ainda choram.
Ninguém assumiu a culpa.
O PAI
Essa garota de doze anos, dando uma entrevista na TV sobre seu pai estar desaparecido após o incêndio, está se transformando no próprio pai. Ela já está uma cabeça e um pescoço mais alta que a mãe, que está de pé atrás dela, olhos avermelhados dardejando de preocupação. Note que, quando o entrevistador pergunta como ela se sente, a filha passa a se tornar o próprio pai. Ela concentra sua resposta sobre as ações que tem de tomar, coisas imediatas sob seu controle. Em alguns dias, ela preencherá os formulários necessários para lhes garantir nova moradia. Ela acordará sua mãe, frágil em luto, e trará até sua cama homus com tahini e makdous com azeite e zátar. Ela fará com que sua mãe tome um banho de manhã e penteará os cabelos da mãe e colocará suas roupas sobre a cama. Ela passou a ler uma série de jornais ao tomar café forte de sabor cardamomo, enquanto Umm Kulthum canta sobre seu coração na rádio.
AZEITONA PRETA
Sou apresentado a uma mulher branca numa festa literária. Sou apresentado a ela como escritor, ela a mim como diretora duma companhia literária. Ela pinça uma azeitona preta e diz Azeitonas pretas são as melhores né não. Adoro tanto comer umas e então ela a bota na boca e subitamente estou dentro dela, saltitando sobre o trampolim macio de sua língua. Fui miniaturizado ao tamanho duma azeitona flutuando numa onda de saliva espumando o topo de seus dentes, e metido pra dentro, colado à bochecha. Antes que me recomponha, uma voz, atrás de um molar rachado, diz Oi. Ele tem o mesmo tom de pele que o meu, e diz Não me diga que é escritor, um romancista? Não, poeta lhe digo. A cantada das azeitonas pretas? Eu aceno, lentamente, com a cabeça. Uma onda de saliva quase nos desequilibra, e um outro cara, mais escuro que ambos, vem, escorregando de bunda. Ele se levanta. Nós todos dizemos Oi.
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